poesia na céu d’ bóka

A fortuna dos encontros fortuitos, que ocorrem frequentemente em solo cabo-verdiano, esteve na génese da poesia na céu d’ bóka. Reza a estória que, no princípio dessa ventura coletiva, terá estado o verbo crioulo, escutado de vagar nas artérias de São Vicente. A sensibilidade e a empatia terão cuidado de garantir mestria ao que sucedeu daí em diante.

A oficina Pé na Txon [em trânsito pela criação de lugares indisciplinados] deambulou por Mindelo até se cruzar com Txon-PoesiaFestival internacional de Poesia de Mindelo
O cruzamento gerou o desafio – desalinhar a escrita! 
Com o método na bagagem e a predisposição criativa renovada, iniciou-se a pintura do poema para rebelar Mindelo. A Fátima e a Otávia, com engenho entregaram-se à arte, suas caligrafias, finas e delicadas, inscreveram na plasticidade os fonemas, gerando assim o verso indisciplinado!
O Centro Cultural de Mindelo foi tomado pela digna rebeldia, enunciada nos versos criados pelo povo das ilhas.

Desses dias desalinhados resultaram uma série de estórias e memórias, que aguardaram, pacientemente, pelo momento de voltarem a rebelar-se. Eis que, sobre chão re-confinado, surge a vontade de resgatar o verbo – o do princípio – e editar a vida, que decorreu entretanto.

Deambulando pelas fotografias de Mindelo, ao ritmo das mornas e das mazurcas de Fogo,  re-encontrei fortuitamente Celina Pereira, sua Voz eloquente inscreveu-se na minha plasticidade e assim surgiu de novo o poema. O povo das ilhas perdeu Celina Pereira, mas certamente preservará sua vida e obra na céu d’ bóka.

A laboriosa tessitura desta singela homenagem a Celina, que declamou o solo crioulo em todo o lugar, pretende afirmar a relevância do verbo indisciplinado, reivindicando a devolução das instituições culturais ao Povo – é tempo dos grémios elitizados, que enchem de inércia os Centros Culturais, saírem de cena! É tempo de libertar a poesia que o povo tem na céu d’ Bóka.

poesia na céu d’ bóka

poesia na céu d’ bóka 

a insularidade é condição onde não cabe o povo das ilhas,
a circunscrição, ditada pelo mar, não é sina é desafio permanente, 
enfrentado com poesia no céu d’ bóka

o solo crioulo é um poema  
declamado pelo cabo-verdiano em todo o lugar,
métrica Brava impossível de ocultar,
inscrita na rebeldia da rima, na firmeza do gesto, na B’ Léza da melodia 

dez versos livres, manuscritos
fazem-se à vida por outras latitudes 
procurando existir além do céu e do mar 
poeira morna, em perpétuo movimento, teima não assentar
 
a orografia das ilhas, 
é um monumento etéreo, 
escrito com mestria, engenho e muita saudade,
chão improvável, fruto de tempestade que virou bonança 

terra madura, talhada a ferro e Fogo, 
em seu ventre germina o pão e o fonema
cresce a árvore ecoa o tambor 
espraia-se sobre suas pedras ao sol a vida e a substância do tempo 

na céu d’ bóka do povo está guardado o virtuoso léxico das ilhas,
deambular pela sua escrita é forma maior de conhecer o mundo.


(Antónia Marques, deambulações pela poesia cabo-verdiana)

kiríasom de Antónia Marques
ku Maria de Fátima Morais e Otávia Fernandes
Txon Poesia – Festival Internacional de Poesia de Mindelo 2ª edição

Créditos
Vídeos
Celina Pereira – Mari D’ Ascençon
Caboindex Videos
https://www.youtube.com/watch?v=XX7r3CA5nO8
Celina Pereira – Ave Maria no Morro
https://www.youtube.com/watch?v=17KFsBpSJFc
Celina Pereira – Eclipse JSM CVMusic
https://www.youtube.com/watch?v=owYzKEWH2H4
Eclipse “B.léza” #CelinaPereira​ #CaboVerde​ #Morna​ Eclipse (Album) Artista Celina Pereira
Compositores Roger Waters
Licenciado ao YouTube por WMG;
LatinAutor – PeerMusic, ARESA, Abramus Digital, LatinAutorPerf


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