O Binde é uma peça cerâmica ancestral, utensílio nuclear nas cozinhas de Cabo-Verde, utilizada para confecionar uma iguaria tradicional – o célebre cuscuz de milho.
A sua produção, cuja génese remonta a um passado longínquo, está identificada como uma das práticas artísticas mais antigas, registada em solo cabo-verdiano.
Os bindes, atualmente produzidos nas olarias do interior da Ilha de Santiago ( Fonte Lima, Trás-di-Monti) e nas ilhas de Boavista (Rabil) e Santo Antão (Porto Novo), são testemunhas de fundamental relevância, para a compreensão dos hábitos e das tradições populares que definem os contornos da identidade cultural do povo Cabo-verdiano.
Estes recipientes de argila, outrora concebidos para responderem a uma necessidade doméstica básica, rapidamente se terão distanciado do estrito cumprimento da função meramente utilitária, são hoje objetos sobreviventes, arquivo fiel de inúmeras estórias e memórias, espólio de uma rica e complexa história coletiva, que cumpre desvendar e evidenciar.
nha bindi, panu di tera
Seguir existindo, com os pés na terra e a alma sequestrada pelo harmatão, é viagem arriscada – não há como escapar ao desígnio da criação.
re.parar, re.colher, re.nomear, re.fazer, re.colectar, re.desenhar.
entre a comoção das palavras e a eloquência das formas sobrevive um jeito outro de estar e ser mundo. nesse re.canto há sol sem vergonha, poeira atrevida, ventania rebelde e um amplo pedaço de tecido. pano cru, que resiste, ambivalente, entre a volição de se entregar ao vento e a nolição de ser mar!
nesse re.canto, re.canta-se a Terra, há espaço, há silêncio, há tempo para ouvir o coração da argila.
nha bindi é uma estória en.cantada, indelével, que decorre entre uma e outra vontade de criar.
Kiriasom di Antónia Marques
junho 2021