Segundo dados da Comissão Nacional de Eleições (CNE), referentes às últimas eleições legislativas, de um total de 10 813 246 eleitores inscritos, 5 248 757 eleitores não votaram, 63 103 eleitores votaram em branco, 83 721 eleitores viram os seus votos anulados, pelo que, o número de eleitores, cujos votos não contribuíram directamente para a eleição de qualquer partido, perfaz a gigantesca soma de 5 395 581. Este trágico e brutal abandono cívico, que se repete e agudiza em cada novo acto eleitoral, não tem merecido atenção ou cuidado especial dos eleitos. A escassa e frágil reflexão sobre o tema, que surge pontual e timidamente nos discursos de boas-práticas eleitorais, habitualmente proferidos à boca-das-urnas, não tem sobrevivido às “noites-eleitorais”, esvai-se, por completo da cena pública, após a divulgação dos resultados finais.
Assim que se concluem as “contas” e se distribuem os mandatos, o poder reorganiza-se e rapidamente esquece o facto de ter sido eleito por uma inexpressiva minoria de votantes inscritos. O exercício dos mandatos confirmará esse esquecimento e, se tudo correr de feição aos eleitos, o abandono cívico irá manter-se ao longo de toda a legislatura, criando condições propícias para que a instrumentalização abusiva da democracia decorra, sem resistência ou empecilhos.
Atendendo à perda de representatividade, que se regista desde 1976, bem como à ausência de medidas efectivas, que contrariem essa tendência, não seria essencial percebermos as razões que sustentam a banalização oficial deste tema?
Antónia Marques
maio 2022